Sítio histórico é restaurado em projeto do IOUSP

Agência Universitária de Notícias. Ano 47. Nº30. 26/06/2014

Terreno da base de pesquisas de Cananeia contém instrumentos antigos de conservação de redes de pesca. Resgate pretende evidenciar contribuição da cultura caiçara para ciência

Uma estrutura utilizada pelos antigos pescadores caiçaras, que estava abandonada há mais de 40 anos na base de pesquisas do Instituo Oceanográfico (IO-USP) João de Paiva Carvalho, em Cananeia, está sendo restaurada pela equipe do projeto “Um Mar de Histórias para Contar” e transformada em sítio histórico. Os objetivos da ação seriam preservar um elemento da cultura caiçara que contribuiu nas pesquisas de campo do Instituto e aproximar a população das atividades da Universidade na região.

A proposta “Um Mar de Histórias para Contar” se encaixa nos propósitos do Instituto de preservar a sua memória histórica e cultural através de documentos e depoimentos, mas se direciona especificamente à região de Cananeia. O sítio histórico, que foi integrado ao projeto, era utilizado durante os primeiros anos de pesquisa do IO na cidade.

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Sítio histórico resgata técnica intitulada"Cascador de Redes" / Créditos: Braga E. S.

Composta por uma banheira de tijolo e cimento, um fogareiro, uma grelha, um cadeirão, um cavalete e um poço artesiano, a estrutura foi descoberta recentemente na parte de trás dos alojamentos da base, em terreno pertencente a ela. Através de pesquisas com funcionários antigos da base de Cananeia e moradores mais velhos da região, as equipes do Museu Oceanográfico e da diretoria do Instituto descobriram que se tratava de uma antigo método de conservação de redes de pesca.

A técnica, apelidada de “Cascador de Redes”, consistia na fervura de cascas de árvores de mangue vermelho em um grande caldeirão, utilizando a água do poço, e no seu despejo dentro da banheira onde seriam mergulhadas as redes de algodão. Depois de um tempo “de molho”, as redes eram retiradas da banheira e colocadas para secar no cavalete, adquirindo um coloração avermelhada.

“Quando a rede está tingida, ela fica mais difícil de ser vista pelos peixes dentro da água e a armadilha tem mais funcionalidade. [A técnica] Também servia para conservar a trama do fio de algodão, que era muito sensível e estragava muito rápido”, explicou Sérgio Teixeira de Castro, biólogo e chefe do Museu, além de integrante do projeto “Um Mar de Histórias para Contar”.

Segundo Castro, embora não haja muitas evidências sobre isso, acredita-se que o método tenha sido passado pelas comunidades indígenas aos caiçaras e seja praticado há séculos na região. A estrutura recuperada teria sido construída logo após a fundação da base em Cananeia no ano de 1949, mas abandonada com advento e barateamento das redes de fios de nylon em meados da década de 70.

Uma equipe foi montada para a restauração dos antigos equipamentos do local. O mato que crescia na região foi retirado e as partes quebradas foram consertadas. Um telheiro, confeccionado com madeira de reflorestamento, foi instalado a fim de se criar um espaço de visitas para a população da região. O objetivo, segundo o biólogo, seria preservar e valorizar uma das técnicas utilizadas pelos caiçaras para pesca e que teria contribuído no início das pesquisas do Instituto na região.

“Queremos mostrar que a oceanografia, além de multidisciplinar, é multifacetada, multicultural. Nosso objetivo aqui é mostrar a importância da cultura caiçara na ciência. Hoje, ela [a ciência] é tratada como se fosse uma descoberta inédita de cientistas renomados(...), quando, muitas vezes, se utiliza de meras adaptações de coisas que já existiam”, opinou Castro.

A restauração do telheiro e da banheira de alvenaria ainda precisa ser finalizada. Para concluir a recuperação, um banner explicativo será colocado no local e o sítio será aberto periodicamente para visitação. O propósito, que se inclui na razão de ser do projeto “Um Mar de Histórias para Contar”, é aproximar os habitantes da região das atividades desenvolvidas na base e na Universidade.

“Antigamente, ninguém sabia o que [a base] era nem por que estava lá. Hoje, abrimos o local para a população durante o aniversário da cidade, fazemos oficinas para as crianças, mostramos por que é importante pesquisar e o que é a oceanografia. Há quinze anos, nem se pensava nisso”, esclareceu o biólogo.

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