Alfabetização oceânica: saiba como ajudar a preservar a “vida na água”

Fonte: CIDADANIA

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Ouça o podcast clicando aqui.

Marcelo Abud

A ONU declarou o período que vai de 2021 a 2030 como a “Década dos Oceanos”. Uma das metas é que se cumpra a ODS 14, que busca promover a conservação e o uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento. Uma das estratégias é a promoção da chamada “alfabetização oceânica”.

“A gente tem um desafio gigantesco de levar à sociedade a temática dos oceanos, para que entendam a importância deles em todos os seus aspectos”, enfatiza o professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (Iousp), Alexander Turra, ouvido pelo Instituto NET Claro Embratel neste podcast.

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Professor Alexander Turra na entrada do Iousp crédito: Daniel Grecco

O tema da alfabetização oceânica é importante não apenas no litoral, mas também em metrópoles e no interior. Muito da poluição que chega nos oceanos vem de rios de pequenas cidades, que captam seu lixo e poluição e os transportam para o mar. “A grande maioria do lixo no mar vem de atividades realizadas em terra, algumas relacionadas ao consumo não consciente, ao descarte inadequado, ao consumo exacerbado de materiais e também à maneira desordenada de ocupação dos territórios”, afirma o entrevistado.

Esse descarte de lixo que vai parar nos rios, muitas vezes, decorre do fato de as pessoas ainda não entenderem o impacto de suas ações. “Muitas coisas são jogadas na pia e no vaso sanitário. Isto é evitado quando a pessoa tem mais informação e autonomia para tomar suas próprias decisões”, defende.

No áudio, Turra dá dicas de como lidar com alguns vilões dos oceanos, como a bituca de cigarro; explica a importância do assunto ser tratado com mais frequência em músicas, vídeos no YouTube e outros meios de comunicação; e valoriza que a alfabetização oceânica seja um tema recorrente nas escolas.

Créditos:
Os trechos das músicas utilizadas no podcast, por ordem de entrada, são: “Planeta Água” (Guilherme Arantes), com Zé Ramalho; e “Luz do Sol” (Caetano Veloso), com Gal Costa. A campanha “Criaturas do Tietê” foi desenvolvida para a Rádio Estadão ESPN (atual Eldorado) e SOS Mata Atlântica. Os trechos de vídeos do YouTube são: “Como reciclar plástico em casa”, do Manual do Mundo; e “Aquecimento global: Oceanos”, do Canal do Pírula.

Crédito da imagem: Damocean – iStock

Transcrição do áudio

Vinheta: “Instituto NET Claro Embratel”

Marcelo Abud:
O período que vai de 2021 a 2030 foi declarado como a “Década dos Oceanos”. Para entender a importância do tema, o Instituto NET Claro Embratel conversa com o professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, Alexander Turra, ele fala sobre uma das estratégias propostas pela ONU: a alfabetização oceânica.

Alexander Turra:
Então, assim, a gente tem um desafio gigantesco de levar pra sociedade a temática dos oceanos, para que as pessoas entendam a importância dos oceanos em todos os seus aspectos e a importância que as ações que essas pessoas fazem/tem nos oceanos, direta ou indiretamente.

Marcelo Abud:
A alfabetização oceânica está dentro de um dos dezessete objetivos de desenvolvimento sustentável, o de número 14, “Vida na água”. Essa ODS propõe a conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos.

Alexander Turra:
Tem metas relacionadas a diminuir pressão de pesca, melhorar a qualidade dos oceanos em relação a poluentes diversos ou mesmo ao lixo no mar que é um grande problema atual; metas relacionadas ao aumento de áreas marinhas protegidas, que são muito importantes pra várias razões, inclusive dentro do cenário das mudanças climáticas. E o clima tá mudando, afetando os próprios oceanos, que, por consequência, afeta o ser humano de uma outra vez e aí a gente vai sofrendo esses efeitos.

Campanha Criaturas do Tietê – a bituca de cigarro:

Locução:
“Vem aí, Criaturas do Tietê.
Ela queimou até a morte, foi jogada na rua e foi encontrada às margens de um rio depois de um temporal alucinante: a bituca de cigarro!

É, aquela bituca inofensiva de cigarro que você joga aí na rua vai parar em rios como o Tietê. Aí ela continua fazendo mal à saúde, só que à saúde do rio, sugando oxigênio da água. Jogue a bituca do seu cigarro apagada, em um lixo. Pequenas atitudes como essa vão ajudar a devolver o Tietê pra nossa cidade. Não jogue lixo no rio. Sua consciência limpa! Tietê vivo!

Há 21 anos Rádio Estadão ESPN e SOS Mata Atlântica, em parceria pelo Tietê vivo.”

Alexander Turra:
Onde as pessoas normalmente jogam bituca de cigarro? Na rua. É um desprendimento, aquela coisa assim, um desapego. E aí, quanto tempo dura/demora para se fumar um cigarro? Talvez seja menos tempo do que pra tomar um refrigerante com canudinho. E eles são equivalentes, o cigarro e o canudinho viram resíduos, e eles são jogados. Com a chuva, vai para o esgoto, vai pra drenagem municipal que já junta com fezes de cachorro e outras coisas que estão por ali e isso vai parar no rio, vai parar no mar. Então, a gente tem uma questão muito clara de atitude das pessoas, de apego ou desapego com essas questões.

Marcelo Abud:
Para o professor, repensar a maneira de comunicar o assunto pode fazer com que a alfabetização oceânica chegue a mais pessoas.

Alexander Turra:
Como que se fala dos oceanos nos meios de comunicação? Se fala muitas vezes de uma forma muito superficial, muito romântica ou muito dedicada a uma questão pirotécnica imediatista. Então, é fundamental que a gente tenha mais produtos de qualidade sendo feitos: documentários, séries, gente fazendo música sobre os oceanos.

Música: Planeta Água (Guilherme Arantes), com Zé Ramalho:
“Água que faz inocente / Riacho e deságua / Na corrente do ribeirão”

Alexander Turra:
Enfim, uma série de produtos complementares que levam a esse entendimento… Youtubers…

Trecho do vídeo Como reciclar plástico em casa (resultado surpreendente!), do canal Manual do Mundo

Mari Fulfaro:
Ele demora um tempão pra se degradar no meio ambiente. E sabe onde ele vai parar no fim? No mar. Quem aí nunca foi pra praia e viu um pedaço de plástico boiando no mar?

Iberê Thenório:
Só para vocês terem uma ideia, hoje tem mais ou menos 250 mil toneladas de plástico boiando nos oceanos. Isso mata baleia, tartaruga, golfinho, passarinho, peixe.., tudo que você possa imaginar

Trecho do vídeo Aquecimento Global: oceanos (#Pirula 32.7), do canal do Pírula

Pírula:
Olá, pessoas, este é mais um vídeo meu aqui na internet. Hoje, continuando sobre aquela série de respostas sobre o aquecimento global, nós vamos falar sobre os oceanos. Então, vamos ver o que que a gente tem para falar sobre essa história aí. Beleza? Vamo nessa!

Alexander Turra:
O lixo no mar, ele não nasce no mar, né? Claro! Algumas atividades realizadas no mar geram lixo, como a pesca, o transporte marítimo… isso acontece. Basicamente 20% do lixo que você encontra no mar vem dessas atividades realizadas no mar. Mas a grande maioria vem de atividades realizadas em terra. Algumas relacionadas ao consumo não consciente, ao descarte inadequado de coisas, ao consumo exacerbado de materiais. Mas às vezes tá relacionado também com o modo que a gente ocupa o território, por exemplo, áreas de invasão, onde não há ofertas de serviços de coleta e destinação final de resíduos. Então, isso também passa pelo compromisso do poder público. Então, a gente tem que fazer a nossa parte, mas cobrar que os outros atores, os outros responsáveis, façam sua parte também. Isso faz parte do desenvolvimento da cidadania que tá por trás da ideia de alfabetização oceânica.

Marcelo Abud:
Mas será que quem mora em uma cidade do interior também deve se preocupar com alfabetização oceânica?

Alexander Turra:
Então a pessoa lá no interior do Brasil, ela tem conexão com os oceanos. O rio vai para o mar. O mar vem pra elas, pela chuva, pela evaporação que chega ali; a roupa que ela está usando ou o material que ela está utilizando veio por um navio; a internet que ela está usando veio por um cabo submarino de comunicação. Então, tem um mundo de coisas que fazem com que os oceanos sejam fantasticamente interessantes.

Música: Luz do Sol (Caetano Veloso), Gal Costa
“Reza, reza o rio / Córrego pro rio e o rio pro mar / Reza a correnteza, roça a beira, doura a areia”

Alexander Turra:
Uma coisa prática que as pessoas podiam fazer é perguntar: “será que a escola que meu filho estuda, será que a escola em que eu dou aula, será que a escola que é vizinha da minha casa, será que essa escola tá trabalhando os oceanos?” Então, acho que o grande ponto é como é que a gente faz, enquanto sociedade, para inserir, internalizar essa temática nas escolas.

Marcelo Abud:
O importante é educar para que as pessoas tenham consciência do que cada atitude pode gerar de benefício ou prejuízo à vida dos oceanos.

Alexander Turra:
Nossa relação com os oceanos pode ser muito explícita ou não ser tão evidente. Por exemplo, as pessoas têm um carro e vão botar gasolina no carro: de onde veio essa gasolina? Veio de petróleo que foi extraído, muito provavelmente aqui no Brasil, do mar. Então, se você tem uma pressão para aumento de uso de combustíveis fósseis, você aumenta a pressão de exploração e a exploração de óleo no mar, de petróleo no mar tem seus riscos.

Música: “Mustang cor de sangue”, Wilson Simonal
“A questão social / Industrial / Não permite e não quer / Que eu ande a pé /
Na vitrine um Mustang / Cor de sangue”

Alexander Turra:
Mas, então, pensar em matriz eólica, matriz solar e outras fontes, biomassa, que podem fazer com que a gente tenha uma pegada, uma emissão menor de CO2. Então, além da gente  resolver um problema relacionado à mudança climática, você diminui um pouco a pressão sobre os ambientes marinhos.

Marcelo Abud:
Pequenas mudanças nas nossas atitudes fazem a diferença.

Alexander Turra:
Quando a gente pensa numa coisa assim mais direta, você vai pensar diretamente no esgoto que você gera. Se joga na pia, se joga na privada várias coisas. Tem pessoas que jogam hastes flexíveis, aquelas que são usadas para limpar o ouvido ou outras coisas, jogam no vaso sanitário, e daí puxa a descarga e acha que beleza, que está tudo bem, está tudo certo. E na verdade não, parte deste material pode parar no mar: é absorvente, é fralda, embalagem de remédio. Se joga muita coisa, fio dental, preservativo…

Marcelo Abud:
Na opinião de Alexander Turra, a alfabetização oceânica será alcançada no momento em que as pessoas tiverem autonomia para tomar as próprias decisões.

Alexander Turra:
A decisão é autônoma e da pessoa e essa decisão vai ser mais robusta com mais informação a pessoa tiver e mais autonomia ela tiver para tomar a decisão. Por isso que eu não gosto muito destas políticas de banimento. Eu acho que o banimento de canudos e de outros produtos, isso passa por cima do processo educativo. Esse é o ponto que a gente tem que chegar em termos da alfabetização, da educação, que é uma alfabetização pra transformação, pra cidadania, para que a pessoa seja autônoma nas suas decisões.

Marcelo Abud:
O descarte de lixo nos rios é feito porque muitas pessoas ainda não entenderam o impacto de suas ações. Isso comprova a importância de todos estarem empenhados na alfabetização oceânica.

Com apoio de produção de Daniel Grecco, Marcelo Abud para o Instituto NET Claro Embratel.

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