Com demanda aquecida, análise de oceanos vira bom negócio

NADIA PONTES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
05/10/2017 02h00

                                                                                                                                                       Herman Tacasey       

Mar de vidro com garrafa, obra do artista Herman Tacasey

Quando se lançaram no mercado, em 2010, os sócios da Salt Ambiental ofereciam um serviço ainda incomum entre empresas de pequeno porte no Brasil: o processamento de variáveis meteoceanográficas, como altura e direção das ondas, temperatura, salinidade e nível do mar.
Apesar dos 8.600 quilômetros de costa, o monitoramento das condições do oceano no país era escasso antes do aquecimento do setor, que foi impulsionado pela exploração de petróleo e pelo transporte de carga.
Desde então, os oceanógrafos e excolegas que fundaram a empresa executaram mais de 200 análises para estudos e implantação de empreendimentos, a maior parte ligada às áreas petrolífera e de logística.
"As ciências marinhas no Brasil ainda são uma novidade. Na parte operacional, é quase inexistente", diz Daniel Ruffato, diretor da Salt Ambiental, incubada no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia da USP.
A empresa, que faturou R$ 1,2 milhão em 2016, recebeu alguns aportes da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), no total de R$ 2,5 milhões.
João Nicolodi, pesquisador e professor da Furg (Universidade Federal do Rio Grande), concorda que o país ainda engatinha nessa área.
Ele coordena a Rede Ondas, que tem oito boias espalhadas em águas rasas, com até 20 metros de profundidade, e disponibiliza a informação de graça na internet.
A rede faz parte da GoosBrasil, sistema nacional de observação dos oceanos supervisionado pela Secretaria da Comissão Interministerial de Recursos do Mar.
No total, a plataforma reúne informações produzidas por mais de 400 equipamentos de monitoramento. 
O acompanhamento dessas condições contou com apoio da Marinha, que, segundo Nicolodi, teve papel fundamental. "Eles têm a estrutura para monitorar águas profundas, de até 500 metros. Poucas embarcações podem fazer esse trabalho".
A disponibilização dos dados para pesquisa foi um entrave, já que informações coletadas por empresas privadas e projetos governamentais não se tornam públicas.
"As empresas geram dados, mas eles não 'conversam', não há padronização ou um sistema", diz Ruffato.
Esse cenário motivou a criação do Sistema Integrado de Monitoramento Ambiental Participativo do Litoral Norte, que contou com a Salt.
Desde 2014, a plataforma online produz dados georreferenciados sobre as condições ambientais, com informações sobre praias, pontos de mergulho, avistamento de animais marinhos e até crimes contra o meio ambiente. Qualquer pessoa pode acessar as informações e contribuir com o sistema.
"Ainda precisamos avançar muito. Com o que construímos nos últimos anos, melhoramos os estudos de dinâmica costeira e dos oceanos. Passamos a ter dados reais para poder comparar com os modelos, que ficaram mais realísticos", afirma Nicolodi.
Os estudos na área, que incluem do monitoramento sobre a saúde do oceano e observação das mudanças climáticas até a previsão meteorológica e planejamento, são estratégicos para o país.
"Séries estatísticas sobre comportamento das ondas são fundamentais numa obra de engenharia. Elas evitam erros e tragédias, como a que aconteceu na ciclovia que desabou no Rio", diz Nicolodi, citando a queda de parte da pista à beiramar que matou duas pessoas em 2016, às vésperas dos Jogos Olímpicos.

Página fonte:
Folha de São Paulo

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