XXIII. Os gigantes da Antártida

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Desde as primeiras expedições antárticas, há mais de 100 anos, observou-se que os indivíduos de alguns grupos de animais de sangue frio (e também de microalgas) possuem tamanhos maiores do que os seus parentes que ocorrem em regiões não polares. Esse fenômeno foi denominado pelos pesquisadores de gigantismo. Mas o que seria o gigantismo? Atualmente, são chamados de “gigantes” os indivíduos que apresentam o dobro do tamanho da média para aquele gênero. Dentre os organismos considerados gigantes encontram-se copépodes, pterópodes, cefalópodes, foraminíferos, anfípodes, isópodes, esponjas de vidro, picnogonidas, equinodermos, diatomáceas e nemertíneos.

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Fauna Antártida: a) Esponjas de vidro (Moran & Woods, 2012); b) Estrelas-do-mar (http://blogdoift.blogspot.com.br/2008/03/pesquisadores-descobrem-estrela-do-mar.html); c) Ctenóforo (Moran & Woods, 2012); e d) Picnogonida (http://oddanimals.com/sea-spider/).

As possíveis causas por trás desse fenômeno têm intrigado os pesquisadores antárticos que, após muitos anos de estudos, ainda não chegaram a uma conclusão definitiva de quais seriam os fatores responsáveis pelo gigantismo. Entretanto, diversas hipóteses foram levantadas, sendo que as principais são:

Fatores ambientais: A temperatura da água do mar na Antártica é baixa e estável ao longo de todo o ano. Nas regiões de gelo temporário ela varia, em geral, entre -1,9 ºC e +2,0 ºC. Em águas frias, a quantidade de oxigênio dissolvido é bem maior, chegando a quase o dobro do que é encontrado em águas quentes tropicais. As taxas metabólicas dos organismos antárticos são relativamente baixas, e eles ainda têm a vantagem de que a maior disponibilidade de oxigênio facilita o transporte e a absorção desse gás para as regiões internas do corpo sem necessitar de um grande gasto de energia. Acredita-se, então, que ambos os fatores combinados, ou seja, oxigênio dissolvido em abundância e taxas metabólicas baixas permitiram que os indivíduos atingissem maiores tamanhos. O Oceano Antártico também é conhecido por ser um ambiente rico em nutrientes, inclusive em sílica. Alguns organismos como, por exemplo, as diatomáceas e algumas espécies de esponjas, constroem as suas estruturas de suporte com esse elemento e, por isso, podem apresentar maiores tamanhos.

Fatores ecológicos: A elevada quantidade de recursos disponíveis, a falta de predadores e o baixo número de níveis tróficos permitem uma alta eficiência energética, o que seria mais um fator a contribuir para o gigantismo. A produção primária fitoplanctônica da Antártida é altamente sazonal devido às grandes diferenças de luminosidade entre o verão e o inverno. Durante o verão, a grande quantidade de nutrientes associada a maior incidência de luz faz com que a produção seja muito elevada. Por outro lado, no inverno, a cobertura de gelo na superfície marinha e a diminuição da incidência de luz faz com que a produção na coluna d’água diminua significativamente, tornando menor a disponibilidade de alimentos. Indivíduos maiores, por poderem armazenar mais energia para suportar esses períodos de menor oferta de alimentos, teriam maiores chances de sobrevivência, o que seria mais uma maneira de se explicar o gigantismo. Além disso, os animais antárticos, de forma geral, vivem mais tempo do que seus congêneres de outras regiões e atingem a maturidade sexual mais tarde. Como eles crescem durante a vida inteira, esse fato também favorece os grandes tamanhos.

É interessante mencionar, que apesar de muitos grupos apresentarem o gigantismo, outros apresentam o fenômeno inverso, ou seja, o nanismo. Os grupos que apresentam o nanismo são principalmente aqueles que possuem estruturas de carbonato de cálcio como os moluscos bivalves. Segundo alguns autores, o nanismo na Antártica é relativamente mais fácil de explicar do que o gigantismo. A construção de conchas e carapaças de carbonato de cálcio em águas frias é um processo fisiológico difícil e energeticamente muito caro, o que favorece os organismos de menores tamanhos.

Podemos concluir que há diversas hipóteses que tentam explicar a ocorrência do gigantismo, porém, nenhuma delas é dada como determinante. Acredita-se que o gigantismo seja mais bem explicado por um conjunto de fatores, ou seja, pela combinação de fatores ambientais, ecológicos e evolutivos.

Leitura sugerida:
MORAN, A. L; WOODS, H. A. Why might they be giants? Towards an understanding of polar gigantism. J. Exp. Biol., v. 215, p. 1995-2002, 2012.

Autores:
Amanda Mattosinhos Spera; Carlos Alberto Bertoldi Trujillo; Claudio Gomes Lins; Cristiano de Salles Almeida; Flávio Cristiano Leopoldo de Andrade; Marina Tenório Botelho; Mateus Gustavo Chuqui

Coordenador: Prof. Dr. Vicente Gomes

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