Gestão costeira de São Paulo não considera o cuidado com o ecossistema, apontam pesquisadores

Fonte: AUN USP

ESTUDO REVISA PRODUÇÃO CIENTÍFICA RELACIONADA À GESTÃO DE PRAIAS DA MACROMETRÓPOLE PAULISTA PARA A VIABILIZAÇÃO DE UMA GESTÃO FOCADA NO ECOSSISTEMA COSTEIRO

Praia de Ubatuba no litoral norte paulistano [Fonte: Agnaldo Andrella/Unsplash]

Pesquisa de pós-doutorado desenvolvida no Instituto Oceanográfico da USP revisa a produção científica brasileira relacionada à gestão de praias da Macrometrópole Paulista (MMP), um dos maiores aglomerados urbanos do Hemisfério Sul, para a viabilização de uma gestão baseada em ecossistemas (GBE). Leandra Gonçalves, pesquisadora de pós-doutorado no Instituto Oceanográfico da USP e uma das autoras do estudo, explica que a gestão baseada em ecossistemas surge como alternativa aos modelos tradicionais de gestão costeira, mas ainda enfrenta desafios para sua aplicação prática. 

“Hoje a gestão costeira busca incorporar alguns princípios baseados em ecossistemas, mas ainda existe muita dificuldade para levar essa abordagem para a prática porque ela inclui considerar diferentes escalas, o manejo adaptativo e que as decisões políticas reflitam os desejos e anseios da sociedade”, afirma.

Durante a investigação, os pesquisadores notaram um número muito pequeno de estudos sobre a macrometrópole paulista, sendo a maior parte deles focados em propostas de mapeamento e classificação da zona costeira. “A macrometrópole é um território onde há grande concentração de pesquisa e financiamento por ser um território onde as praias tem um grande valor, especialmente o litoral norte de São Paulo, e apesar disso, encontramos poucos estudos com o nosso critério de busca e vimos que nenhum deles é, por exemplo, uma análise de processos de gestão”, explica Luciana Xavier, pesquisadora de pós-doutorado do Laboratório de manejo, ecologia e conservação marinha do Instituto Oceanográfico da USP e também autora do estudo. 

Impactos de uma gestão ineficiente

Dentre os impactos que uma gestão ineficiente pode trazer para o ecossistema costeiro, podemos citar a supressão da vegetação (pela construção de casas nas dunas, por exemplo) e danos físicos que alteram a morfologia da praia, o que pode comprometer completamente o ecossistema, como explica Helio Hermínio Checon, pós-doutorando do Instituto Oceanográfico da USP e coautor do estudo. 

“As praias são ambientes dinâmicos e que dependem do transporte de sedimentos, então qualquer alteração não controlada pela gestão, como muros na areia ou construção na água que interrompam o fluxo das ondas e marés, responsáveis pelo transporte de sedimento, pode aumentar o processo de erosão da praia”, indica Helio.

A fauna residente também pode ser impactada caso não seja considerada na gestão costeira. Os principais animais prejudicados são os que vivem enterrados na areia ou na água – invertebrados aquáticos tal como tatuíra, vôngole e bolacha-da-praia – e os peixes juvenis que utilizam a margem da praia como local de alimentação e refúgio contra predadores. Além disso, muitas espécies de aves e tartarugas marinhas utilizam a praia para construção de ninhos. 

A ação antrópica nas praias também é um desafio para a gestão, já que o lixo pode causar danos biológicos pela liberação de compostos tóxicos, reduzindo não só a atratividade da praia, mas também prejudicando a economia local. Só em um feriado prolongado em setembro do ano passado, mais de 400 toneladas de lixo foram retiradas das praias da Baixada Santista, segundo o portal G1.

Caminhos para uma gestão baseada em ecossistemas

A pesquisa aponta ainda que embora o Brasil figure entre os países com maior número de praias estudadas no mundo, as publicações científicas que apresentam alguma relação à gestão desse ecossistema são pouco numerosas, difusas e recentes. 

Na opinião de Luciana Xavier, este cenário pode mudar com a municipalização das praias, o que pode fazer com que tanto pesquisadores, quanto gestores, olhem mais para a saúde da costa paulista. “A municipalização da gestão de praias do Governo Federal para os governos municipais, vai fazer com que os municípios tenham que desenvolver seus projetos, planos de gestão integrada à orla e consequentemente, dar mais atenção às suas praias”, explica a pesquisadora.

Além disso, entre 2021 e 2030, o mundo viverá a Década do Oceano, proposta da ONU para conscientizar a população sobre a importância dos oceanos. Para Luciana, essa pode ser mais uma oportunidade de modificar a forma como esses ambientes são geridos. “Eu entendo as praias como a porta de entrada para o oceano e por isso a importância da gente olhar, conhecer e gerir as praias para que elas continuem existindo, fomentando essa cultura oceânica e chamando atenção para o oceano”, finaliza a pesquisadora.

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