Ameaçadas de extinção, toninhas sofrem com captura acidental em redes de pesca
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- Publicado: Segunda, 23 Janeiro 2023
Fonte: Jornal da USP
Livro de pesquisadores da USP mostra o drama desses pequenos cetáceos que são capturados por acidente em atividades pesqueiras nas regiões costeiras do Brasil, Uruguai e Argentina
“A toninha é um pequeno golfinho que ocorre, exclusivamente, em águas litorâneas do Sudeste e do Sul do Brasil, do Uruguai, e do norte da Argentina. O maior fator de mortalidade da toninha trata-se de um acidente operacional quando redes de pesca buscam capturar pescado visando a trazer proteína marinha para consumo humano. Mesmo dotada de um eficiente sistema de ecolocalização, a toninha vem se emaranhando em redes de pesca e, por não conseguir subir à superfície da água para respirar oxigênio do ar por meio de seus pulmões, morre afogada”, alertam os autores do e-book Toninha, um pequeno cetáceo ameaçado de extinção, disponível gratuitamente no site do Laboratório de Biologia da Conservação de Mamíferos Aquáticos (LABCMA) do Instituto Oceanográfico (IO) da USP. É possível baixar a publicação neste link.
O livro é resultado do estudo Avaliação sobre o estado da arte dos conhecimentos com vistas à conservação da toninha, Pontoporia blainvillei, um pequeno cetáceo ameaçado de extinção, vinculado ao Programa de Iniciação Científica e de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação da USP, com autoria de Isabela Rugitsky Domingues, do Instituto de Biociências da USP, sob orientação do professor Marcos César de Oliveira Santos, do Instituto Oceanográfico da USP.
Golfinho do rio
A toninha, também conhecida como “franciscana” e “La Plata dolphin”, é um pequeno cetáceo endêmico da costa da América do Sul. Apesar de ser considerada uma das cinco espécies existentes de “golfinhos de rio”, a toninha habita preferencialmente a costa marinha, com duas populações descritas para águas estuarinas. A espécie é caracterizada por um tamanho relativamente pequeno, quando comparada a outros membros da ordem Cetacea. Seu comprimento na idade adulta pode variar entre 113 cm e 136 cm para os machos, e 129 cm e 180 cm para as fêmeas, e sua coloração é amarronzada no dorso, com tons acinzentados.
Elas costumam viver em pequenos grupos, compostos de dois a cinco indivíduos, mas já foram avistados grupos maiores na costa do Rio de Janeiro, chegando a 15 indivíduos, e no complexo estuarino de Paranaguá, com 12 indivíduos. Sua alimentação é composta, preferencialmente, de peixes e lulas, e sua predação ocorre por espécies como os tubarões-tigre e as orcas. A expectativa de vida para a espécie é de cerca de 20 anos.
Em razão de sua distribuição restrita, pequenos estoques populacionais, hábito de vida próximo à costa e ameaças que sofre ao longo da distribuição, a toninha é o pequeno cetáceo mais ameaçado de extinção no Atlântico Sudoeste, segundo informações do livro. Atualmente, é classificada como “ameaçada e vulnerável à extinção” na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). No Brasil, até 2018, a espécie se encontrava na categoria “criticamente em perigo”, no Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, de acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), como informam os autores na introdução.




Preocupação ecológica
Não há dados do número real de toninhas. “A maioria dos registros efetuados até o presente momento leva em conta somente animais encontrados encalhados e, portanto, quando comparada com o acompanhamento da frota pesqueira e avistamentos de toninhas presas em redes, a mortalidade acidental acaba sendo subestimada”, apontam os pesquisadores. A captura acidental ocorre ao longo de todo o ano na costa brasileira e principalmente no verão e primavera no Uruguai e na Argentina. O contexto da intensa ameaça sofrida pela toninha durante anos ao longo da distribuição trouxe preocupações em relação à manutenção do tamanho dos estoques populacionais.
Em função deste cenário, em 2000 foi realizado um workshop com cientistas originários principalmente do Brasil, Uruguai e da Argentina que tinham experiência com investigações e ações voltadas à conservação das toninhas. O encontro teve como foco a compilação das informações publicadas até aquele ano, referentes à biologia e à ecologia da espécie, e a discussão sobre estratégias efetivas para a sua conservação. O estudo foi realizado com base na revisão bibliográfica de artigos científicos publicados sobre a biologia e a conservação de toninhas, antes e depois da publicação dos resultados obtidos com o workshop, trazendo uma versão atualizada sobre o estado atual de conhecimentos sobre a espécie.
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Como salvá-las da extinção?
Segundo Marcos, é preciso estruturar políticas públicas, com a participação de cientistas e agentes de meio ambiente, assim como dos representantes governamentais estaduais na costa dos Estados, regiões, municípios e províncias onde ocorre a toninha, as agências e as colônias de pesca que usam redes para captura de pescado, educadores, e professores de todos os níveis de ensino básico, médio e superior que atuam na faixa litorânea de ocorrência da toninha. “Em uma ação conjunta, deve-se avaliar mais precisamente os números de capturas acidentais no tempo e no espaço por meio de monitoramento integrado por pelo menos dois anos, avaliar a produção pesqueira com uso de redes gerada nessa faixa de costa pelos três países e o impacto econômico que geram, avaliar alternativas de subsistência para uma parte da comunidade pesqueira visando a futuros acordos coletivos de defeso sazonal ou permanente dos estoques pesqueiros em algumas áreas de ocorrência da toninha”, sugere o professor, lembrando que isso evitaria a mortalidade da espécie.

Além disso, Marcos lembra que todo esse processo deve ser acompanhado por um programa educacional básico e padronizado para que as três referidas nações adotem a toninha como um símbolo de proteção ao oceano. “Como ela é um predador de topo de teia alimentar, ela mantém a diversidade biológica de todos os componentes abaixo dela, e por isso deve continuar nesse sistema para mantê-lo em equilíbrio, informa e acrescenta: “Esse processo todo pode levar entre seis e dez anos para que, a partir desse esforço, a sequência do manejo dessa espécie e do estoque pesqueiro seja baseado em um robusto banco de dados coletados de forma tripartite, e que norteará os ajustes regionalizados”.
Para baixar o e-book Toninha, um pequeno cetáceo ameaçado de extinção clique aqui.