Nova boia para medir ventos oceânicos

Fonte: Revista Pesquisa Fapesp

 

Pesquisadores brasileiros criam dispositivo fundamental para a implantação de usinas eólicas em alto-mar

 

Bravo: boia encontra-se em teste no litoral potiguar - Petrobras
 

Um projeto conduzido pela Petrobras em parceria com o Instituto Senai de Inovação (ISI) deverá resultar em uma tecnologia, inédita no país, capaz de reduzir o custo de instalação de parques de energia eólica offshore, aquela gerada a partir dos ventos que sopram em alto-mar. A equipe de pesquisadores brasileiros criou um equipamento, nomeado de Bravo – acrônimo de boia remota de avaliação de ventos oceânicos –, dotado de um sistema de sensoriamento que capta dados meteorológicos e oceanográficos de forma automatizada, entre eles a velocidade e a direção dos ventos marítimos. Esses dados são essenciais para a realização de estudos de potencial energético necessários para a construção de usinas eólicas no mar.

Desenvolver tecnologias para a exploração da energia gerada pelos ventos oceânicos é importante porque o Brasil tem vasto litoral e grande área marítima. Estudos recentes revelam que muitas regiões costeiras são adequadas para a instalação de usinas eólicas por contarem com ventos em velocidades adequadas para a geração de energia.

“Diversas multinacionais do setor de energia têm demonstrado interesse em explorar nosso potencial eólico offshore. O projeto da Bravo proporcionará a nacionalização de uma tecnologia usada no mapeamento dos recursos eólicos marítimos. Não existe, no momento, um fornecedor local com equipamento próprio validado para essa aplicação”, afirma o engenheiro mecânico Antonio Medeiros, coordenador de pesquisa e desenvolvimento do ISI em Energias Renováveis, sediado em Natal (RN). O projeto também teve a participação do ISI em Sistemas Embarcados, localizado em Florianópolis (SC).

Algumas empresas nacionais, informa o especialista, já oferecem boias que mensuram parâmetros meteorológicos (temperatura do ar, umidade relativa e pressão atmosférica) e oceanográficos (ondas e correntes marítimas). “A maioria desses dispositivos também mede ventos de superfície, que sopram a até 2 metros [m] de altura. Para a implantação de um projeto eólico em alto-mar, contudo, precisamos conhecer o comportamento dos ventos acima de 100 m, na altura do rotor dos aerogeradores [ou turbinas eólicas]”, diz Medeiros. Ele destaca que boias como a Bravo são uma alternativa às torres fixas de medição, cujo custo de instalação é maior.

O engenheiro naval Alexandre Nicolaos Simos, do Departamento de Engenharia Naval e Oceânica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), avalia como positivo o desenvolvimento da Bravo. “Temos uma carência muito grande no país de medidas de monitoramento do oceano. As medidas de vento tomadas no ambiente marítimo são fundamentais para que se possa fazer corretamente o planejamento dos projetos de parques eólicos offshore”, ressalta. Simos lidera um estudo, financiado pela FAPESP e por outras instituições, voltado ao desenvolvimento de turbinas eólicas flutuantes – a maioria das turbinas offshore no mundo é fixa e tem como fundação pilares fincados no leito marinho (ver Pesquisa FAPESP no 290).

Período de testes
O primeiro modelo da Bravo começou a ser testado no final de novembro. A boia foi lançada a cerca de 15 quilômetros (km) da costa de Areia Branca, município do litoral norte potiguar, onde deverá permanecer por pelo menos sete meses. Com 2,5 m de diâmetro e 3,5 m de altura, ela é dotada de um casco de fibra de vidro, uma estrutura metálica que faz conexão com o sistema de ancoragem e um suporte para a instalação dos sensores, entre eles um anemômetro ultrassônico para a medição da direção e velocidade do vento a nível do mar e um sensor anemométrico remoto com tecnologia Lidar (detecção de luz e medida de distância) para a coleta dos parâmetros do vento até cerca de 200 m acima do nível do mar.

O Lidar funciona assim: o sensor envia pulsos de luz laser para cima, que são refletidos de volta por partículas ou aerossóis carregados pelo vento, em várias alturas. O tempo de viagem da luz até as partículas e de volta determina a altura em que ocorreu a reflexão. Um fenômeno físico chamado efeito Doppler faz com que a frequência da luz refletida seja ligeiramente diferente da original enviada pelo Lidar. Essa diferença determina a velocidade da partícula e, consequentemente, do vento na altura de medição.

As informações são transmitidas para um servidor em nuvem por meio de comunicação por satélite, para serem posteriormente analisadas”, informou a Petrobras por meio de sua assessoria de imprensa. Módulos fotovoltaicos e duas pequenas turbinas eólicas conferem autonomia energética à boia.

Os dados coletados pela Bravo durante o período de testes serão comparados com informações colhidas por outro sensor Lidar fixo instalado no Terminal Salineiro de Areia Branca, porto localizado a 26 km da costa, próximo de onde a boia foi lançada.

No mundo, segundo a Petrobras, existem equipamentos com sensor Lidar flutuante em países como Estados Unidos, França, Reino Unido e Noruega. A companhia estima uma redução de 40% no custo da medição eólica offshore com a Bravo em relação à contratação de uma empresa do exterior para a prestação do serviço no Brasil. “A Bravo poderá contribuir para o aumento da oferta dos serviços e redução do custo de implantação dos projetos de eólica offshore no país”, informou a Petrobras.

Doutor em oceanografia e coordenador do Laboratório de Hidrodinâmica Costeira do Instituto Oceanográfico (IO) da USP, o físico Marcelo Dottori vê como positiva a tentativa de nacionalização de tecnologias empregadas em projetos oceanográficos. “Temos uma riqueza enorme no mar e, por isso, o desenvolvimento de dispositivos como a Bravo são relevantes. Não falo apenas da boia em si, mas do conjunto de sensores instalados nela”, destaca. “Somos altamente dependentes de equipamentos produzidos no exterior. Precisamos romper essa dependência.”

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