Efeitos indiretos do aquecimento global prejudicam a pesca da sardinha

Fonte: AUN

PESQUISA ANALISA FENÔMENOS MARINHOS QUE VÊM SE INTENSIFICANDO À MEDIDA QUE A TEMPERATURA DO OCEANO AUMENTA. PESCA DE SARDINHA NUNCA MAIS VOLTOU AOS PATAMARES DOS ANOS 1970

Imagem: Reprodução / PxHere

Na tese Dipolo Subtropical do Atlântico Sul e Capturas de Sardinella Brasiliensis no Contexto de Aquecimento da Superfície do Oceano Atlântico Sul entre 1970 a 2019, a mestra Blanka Piekas, do Instituto Oceanográfico (IO) da USP, investigou as relações entre a ocorrência do fenômeno do Dipolo Subtropical do Atlântico Sul e a queda no volume de pesca da Sardinella Brasiliensis – espécie de peixe encontrado especialmente na região costeira do Brasil, conhecida popularmente como sardinha-verdadeira.

Imagem: Esquema simplificado representando o Dipolo Subtropical do Atlântico-Sul (DSAS) em fase positiva. Nele estão representados os dois pólos formados entre as regiões sudoeste e nordeste do Oceano Atlântico. Um dos polos com Anomalia de Temperatura da Superfície Marinha (ATSM) negativa e outro positivo. [Fonte: Blanka Piekas Schlichta – Dissertação de Mestrado]
Dipolo Subtropical do Atlântico Sul é um fenômeno que ocorre no Hemisfério Sul do Oceano Atlântico, reunindo fatores atmosféricos e oceânicos. Assim como os conhecidos El Ninõ e La Niña, ele ocorre naturalmente de tempos em tempos. Porém, sua ocorrência está sendo impactada pelo aquecimento global. “O Dipolo é um modo de variabilidade, o que é intrínseco ao sistema climático. Mas o que a literatura mostra é que há indícios de um aumento de sua frequência nas últimas décadas”, afirma a pesquisadora.

A chamada fase positiva deste fenômeno ocorre quando a Alta Subtropical do Atlântico-Sul – sistema de alta pressão atmosférica característico desta região do planeta – se desloca para o Sul, provocando um aumento da evaporação na camada mais superficial do Oceano. “Isso faz com que a camada de mistura se torne mais fina, e portanto, mais suscetível ao calor emitido pela radiação solar, resultando em um aquecimento da região sudoeste do Atlântico, quando comparada à região nordeste.”, afirma Blanka.

A pesquisa feita pela mestranda identificou que esta fase positiva do fenômeno é a mais prejudicial para o sucesso do recrutamento da sardinha-verdadeira. Porém ela constatou que a sua fase negativa – quando o contrário ocorre, ou seja, um resfriamento do sudoeste em oposição à um aquecimento do Nordeste – também provoca consequências negativas para a espécie. 

Imagem: Do lado esquerdo: Padrão oceânico de anomalia de temperatura da superfície do mar correspondente ao composto de anos com menos capturas de sardinha (1988 -2019). Do lado direito: Esquema simplificado do Dipolo Subtropical do Atlântico Sul fase positiva. [Fonte: Blanka Piekas Schlichta – Dissertação de Mestrado]

A pesquisadora, que iniciou seu trabalho de pesquisa em 2020 e defendeu a dissertação no dia 18 de abril de 2023, utilizou programas de computador como PythonRStudio e Climate Data Operator para cruzar os dados disponíveis sobre o volume de pesca de sardinha (disponíveis na plataforma de livre acesso Sea Around Us) com os períodos de ocorrência do Dipolo Subtropical. Sempre levando em consideração os dois anos de margem, que é o tempo aproximado para a reprodução da sardinha até a sua captura pelos pescadores.

Após a análise desses dados, Blanka propôs a separação da pesca da sardinha brasileira ao longo das últimas décadas em três períodos: E1 – período que vai de 1970 até o fim dos anos 1980; Transição – que vai de 1985 até 1988, quando a captura da sardinha sofreu uma queda acentuada; e dos anos 1988 até os dias atuais, quando o volume de pesca se estabilizou, porém nunca voltando aos patamares de antes. 

Imagem: Variação da temperatura do mar do Oceano Atlântico Sul em relação à quantidade de sardinha pescada (com correção de menos dois anos), abrangendo os três períodos estudados pela pesquisadora: E1 (1970-1985), Transição (1985-1988) e E2 (1988-2019). [Fonte: Blanka Piekas Schlichta – Dissertação de Mestrado]

Para a pesquisadora, o que pode prejudicar o sucesso do recrutamento da sardinha são as variações das condições oceânicas e atmosféricas durante as primeiras etapas de vida da espécie: “Nas fases planctônicas, esses organismos não têm locomoção eficiente para vencer as correntes, o que as deixa mais suscetíveis às intempéries do ambiente”.

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